Friedman: Obama ajudou a melhorar a imagem dos EUA no exterior
Thomas L. Friedman
Colunista do The New York Times
No Cairo, Egito
Esta coluna provavelmente colocará Barack Obama em apuros, mas não é problema meu. Eu não posso mentir: muitos egípcios e outros muçulmanos árabes realmente gostam dele e esperam que ele conquiste a presidência.
Eu tive a chance de observar várias eleições americanas do exterior, mas tem sido incomumente revelador estar no Egito enquanto Barack Hussein Obama se torna o candidato dos democratas para presidente dos Estados Unidos.
Apesar de Obama, que foi criado como cristão, estar constantemente assegurando aos americanos que não é um muçulmano, os egípcios estão espantados e empolgados com a possibilidade dos Estados Unidos poderem eleger um homem negro cujo pai era de tradição muçulmana. Eles realmente não entendem a árvore da família de Obama, mas o que sabem é que se os Estados Unidos -apesar de terem sido atacados por militantes muçulmanos no 11 de Setembro- elegerem como presidente um sujeito com nome do meio "Hussein", isso marcaria uma mudança nas relações entre os americanos e o mundo muçulmano.
Toda entrevista parece terminar com a pessoa que estou entrevistando me perguntando: "Agora eu posso lhe fazer uma pergunta? Obama? Você acha que vão deixá-lo vencer?" (É sempre "deixá-lo vencer", não apenas "vencer".)
Não seria um exagero dizer que a indicação pelos democratas de Obama como seu candidato à presidência fez mais para melhorar a imagem dos Estados Unidos no exterior -uma imagem arranhada pela guerra no Iraque, pela invocação pelo presidente Bush de uma "cruzada" pós-11 de Setembro, Abu Ghraib, Guantánamo e a oposição xenófoba à Dubai Ports World administrar portos americanos- do que todo o esforço diplomático de Bush por sete anos.
É claro, os egípcios ainda têm suas queixas em relação aos Estados Unidos, e terão no futuro independente de quem seja o presidente- e também temos algumas queixas em relação a eles. Mas de vez em quando os Estados Unidos fazem algo tão radical, tão fora do comum -algo que as sociedades antigas, incrustadas, tradicionais como as do Oriente Médio simplesmente nunca poderiam imaginar- que ela revive a "marca" revolucionária dos Estados Unidos no exterior de uma forma que nenhum diplomata poderia ter concebido ou planejado.
Eu acabei de jantar em um restaurante à margem do Nilo com duas autoridades egípcias e um empresário, e um deles citou um de seus filhos como tendo perguntado: "Algo assim poderia algum dia acontecer no Egito?" E a resposta de todos à mesa foi, é claro, "não". Não poderia acontecer em nenhum lugar nesta região. Um copta poderia se tornar presidente do Egito? Nenhuma chance. Um xiita poderia se tornar líder da Arábia Saudita? Nem em cem anos. Um presidente bahaísta do Irã? Apenas em sonho. Aqui, o passado sempre enterra o futuro, não o contrário.
Estas autoridades egípcias estavam particularmente empolgadas com a indicação de Obama, porque poderia significar que ser rotulado de reformista "pró-americano" poderia deixar de ser um insulto aqui, como tem sido nos últimos anos. Como um diplomata americano colocou para mim: a postura de Obama sugere aos estrangeiros que ele não apenas escutaria o que eles têm a dizer, mas que poderia até levar em consideração. Eles antecipam que um presidente americano que passou parte de sua vida olhando para os Estados Unidos de fora -como ocorreu com John McCain enquanto era prisioneiro de guerra no Vietnã- estará muito mais harmonizado com as tendências globais.
Meu colega Michael Slackman, chefe da sucursal do "Times" no Cairo, me falou sobre um recente encontro que teve com um operário na famosa Mesquita Azul do Cairo: "Gamal Abdul Halem estava sentado em um tapete verde. Quando ele viu que éramos americanos, ele disse: 'Hillary-Obama empatados?' em um inglês rudimentar. Ele me disse que morava no Delta do Nilo, viajava duas horas todo dia para chegar ao trabalho, e ainda assim encontrava tempo para acompanhar a disputa presidencial. Ele não tinha nada ruim a dizer sobre Hillary, mas sentia que Obama seria muito melhor, por ter pele escura, como ele, e por causa de sua herança muçulmana. 'Para mim, minha família e amigos, nós queremos Obama', ele disse. 'Nós todos gostamos do que ele diz.'"
Sim, toda esta Obamamania é excessiva e o balão inevitavelmente será furado caso ele conquiste a presidência e comece a tomar decisões difíceis ou cometer grandes erros. Mas por ora, o que ela revela é quanto muitos estrangeiros, após todo o ressentimento dos anos Bush, ainda anseiam pela "idéia da América" -este lugar aberto, otimista e, de fato, revolucionário, tão radicalmente diferente de suas próprias sociedades.
Em sua história dos Estados Unidos do século 19, "What Hath God Wrought", Daniel Walker Howe cita Ralph Waldo Emerson como tendo dito em um encontro da Associação da Biblioteca Mercantil, em 1844, que "a América é o país do futuro. É um país de inícios, de projetos, de vastos planos e expectativas".
Esta é a América que foi engolida pela guerra contra o terrorismo. E é a América que muitas pessoas querem de volta. Eu não sei se Obama vencerá em novembro. Mas independente dele vencer ou não, o simples fato de sua indicação fez algo muito importante. Nós surpreendemos a nós mesmos e surpreendemos ao mundo e, ao fazê-lo, lembramos a todos que ainda somos um país de novos inícios.
Tradução: George El Khouri Andolfato
Uol - Midia Global
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